quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

O que não reluz também pode ser ouro

Cooperativa de Catadores da Vila Castilho melhora a vida de famílias ao contribuir com a cidade

 

 

Por: Leandro Lopes

leandro.lopes@diariopopular.com.br

 

O que representa o lixo para você? Algo inútil, que deve ser descartado? Algo sem serventia? Para famílias como a do seu Jair é bem mais do que isso.
Presidente da Cooperativa de Catadores da Vila Castilho (COOPCVC), Jair Moreira trabalhou por mais de 15 anos no aterro municipal, próximo à rua Marcílio Dias. Revirando o entulho ele sempre lutou para melhorar as condições de vida dos familiares, enfrentando intempéries e se expondo diariamente a riscos. “Nós sempre íamos pra lá à noite, com chuva, frio, tanto faz, não tinha tempo ruim. Precisávamos estar lá, dependíamos disso pra sobreviver. O lixo sempre foi nossa fonte de renda.”
                           Trabalho na cooperativa torna viável a reciclagem de resíduos (Foto: Leandro Lopes - DP)

Em 2012 o aterro foi fechado pela Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam). Mas o que poderia ser o fim para os que frequentavam o espaço foi, na verdade, um recomeço. As cooperativas de reciclagem ganharam força na cidade. Depois de alguns entraves administrativos, neste período foi formada a COOPCVC.

 
                           Esteira doada pelo Rotary acelera o processo e facilita a vida dos cooperados (Foto: Leandro Lopes - DP)

Enquanto fala sobre a estrutura montada com muito esforço e suor, Jair sorri e contempla as paredes do galpão, na rua Doutor Amarante. “Desde que começamos a trabalhar na cooperativa nossas condições de vida melhoraram muito. No aterro nós não vivíamos. Agora tudo mudou. Podemos dormir, mexemos com um lixo mais limpo, resíduos melhores, e assim podemos ficar mais tempo com os nossos filhos, nossa família”, conta, sem disfarçar a satisfação.
Enquanto no aterro o trabalho era muitas vezes individual, no galpão todos os 14 funcionários aprenderam o real sentido do verbo “cooperar”. Segundo Jair, juntos todos trabalham com mais vontade, um ajudando o outro. “Formamos uma família”, resume.

                                             Esteira doada pelo Rotary acelera o processo e facilita a vida dos cooperados (Foto: Leandro Lopes - DP)
                                                
E quando se fala em “família” na COOPCVC não é apenas no sentido figurado. Ana Paula, esposa de Jair, também trabalha no local. A exemplo do marido, ela fala do serviço com orgulho. “O lixo é dinheiro. É uma ação que fazemos pra ter lucro, mas que não beneficia apenas o nosso grupo. O material que é recebido aqui nós classificamos, reciclamos e mandamos pra fora. Assim ele não entope as valetas e não polui a cidade.”

Ajuda necessária e reconhecida


Através de convênios e parcerias, a associação foi passando por mudanças significativas ao longo dos anos. O Serviço Autônomo de Saneamento de Pelotas (Sanep) oferece uma bolsa mensal às cooperativas. O valor é destinado para remunerações e pagamento de custos fixos, como aluguel do prédio e energia elétrica. A quantia, segundo Jair, é fundamental para a continuidade do trabalho. “Esse repasse do Sanep é uma grande ajuda. Sem isso nós não conseguiríamos nos manter.”
Para o diretor-presidente da autarquia, Jacques Reydams, o bom resultado do serviço realizado na COOPCVC é, da mesma forma, fundamental à cidade. Um departamento acompanha a gestão das cooperativas e a da Vila Castilho tem resultados surpreendentes. Conseguiu inserir o trabalhador na sociedade e oferecer uma boa perspectiva e qualidade de vida às pessoas.

                       Cooperados pedem que população separe o lixo; material não reciclável chega com frequência na COOPCVC (Foto: Leandro Lopes - DP)

O Sanep investe também nas outras quatro cooperativas de reciclagem de Pelotas. Os resultados obtidos vêm orgulhando o poder público. “Eles cresceram muito. Uma outra associação, localizada na Pinheiro Machado, já tem duas viaturas próprias. Todos têm condições de melhorar e aumentar suas capacidades de reciclagem e isso é espetacular para nós. Junto com a prefeitura vamos continuar investindo e pretendemos montar mais uma cooperativa. Isso significa menos descarte no meio ambiente. É supergratificante”, diz Reydams.
Cada vez mais prefeituras estão investindo em usinas de reciclagem. O reaproveitamento de resíduos de construção pode reduzir custos na aquisição de materiais aplicados em obras como, por exemplo, a pavimentação de vias públicas.

                                                Resíduos chegam à cooperativa pela Coleta Seletiva e doações da comunidade (Foto: Leandro Lopes - DP)

Quem também acompanha com orgulho a produção dos cooperados da Vila Castilho é o Rotary Club Pelotas Norte. A entidade realizou a compra do maquinário utilizado pelos funcionários da COOPCVC em todo o processo de reciclagem. Entre os equipamentos adquiridos estão uma prensa e uma esteira, que influenciam diretamente na qualidade do trabalho desenvolvido na cooperativa. O manuseio dos resíduos, antes e depois de selecionados, ficou mais fácil e saudável.
Um dos diretores do Rotary, que preferiu não se identificar, diz que poder auxiliar no crescimento das pessoas é a maior alegria para os associados. “Ajudar o próximo não tira pedaço. Cada vez mais ficamos contentes por poder fazer isso. Pudemos dar esses equipamentos e, aos poucos, eles também estão adquirindo outros. Isso é importante, não é apenas a questão da doação, mas sim de melhorar a qualidade de vida de pessoas que se empenham e querem ser ajudadas. Admiramos muito aqueles trabalhadores”, diz.


                              Jair trabalhou 15 anos no aterro municipal; ele é o presidente da COOPCVC (Foto: Leandro Lopes - DP)

E esta admiração dos rotarianos não se materializa “apenas” nos materiais ofertados. O presidente da COOPVCV ganhou, em outubro de 2015, um diploma de reconhecimento profissional oferecido pelo Rotary. Reconhecimento este que pode ser percebido nas ruas. “A comunidade nos cumprimenta, nos agradece. É emocionante. Sentimos que nosso trabalho faz diferença. Isso é a coisa mais importante”, garante Jair.


É possível melhorar


Para que a cooperativa da Vila Castilho e as demais associações da cidade possam dar sequência ao trabalho de reciclagem é importante que a comunidade também ajude.
Jair ressalta que a COOPCVC recebe resíduos de duas formas: através de doações e pela Coleta Seletiva. De acordo com Reydams, nos últimos três anos vem sendo recolhida a mesma quantidade de resíduos por mês em Pelotas: 150 toneladas. O número ainda é pequeno perto das 4,8 mil toneladas mensais produzidas na cidade. “Temos um potencial de crescimento muito grande. Com o empenho da comunidade teremos menos descarte em aterros e mais renda para as cooperativas, que podem beneficiar - cada uma - até 20 famílias.”
Separar e doar os resíduos para cooperativas como a da Vila Castilho pode representar uma cidade mais limpa, um meio ambiente menos poluído e muito mais sorrisos sinceros de trabalhadores, como o Jair.

  Cooperativa de Catadores da Vila Castilho - COOPCVC 

 

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